Técnico em metalurgia pelo Senai, seguir uma faculdade não
estava em seu horizonte, tampouco servir o Exército – “Um amigo da família
conseguiu minha dispensa, coisa rara na época”. Em 1973, arranjou um emprego
numa loja que consertava escapamentos. O serviço ficava perto do cais de
Santos, na rua Brás Cubas. Na carteira, o rapaz ganhava um salário mínimo.
Alguns clientes lhe davam caixinha, o que aumentava o orçamento. Em outras
ocasiões, ele fazia o que chama de “pequenos trambiques”: “Chegava algum bacana
com algum problema fácil de resolver, e eu dizia: ‘O silencioso tá fodido.’ Aí
eu guardava o silencioso, e depois vendia a um preço mais barato para um
cliente mais humilde. E nisso eu também faturava algum.”
A loja de escapamentos era só um dentre os muitos outros
estabelecimentos da rua, que incluíam prostíbulos. “A zona do cais de Santos é
a maior zona do país”, comentou, com certo orgulho e talvez alguma hipérbole.
No final do expediente, quase toda noite ele perambulava pelo bairro. Na
primeira vez que tentou transar com uma prostituta, ela recusou. E mesmo assim
lhe cobrou uma taxa. Na segunda vez aconteceu algo parecido: a prostituta
chegou a masturbá-lo, mas não passou daí. Ele pagou de novo. “Eu era muito
inocente”, ele diz. Com 18 anos e uma graninha no bolso, quis conhecer as casas
de tolerância. Então foi à pensão Brás Cubas. Pagou pelo quarto e deu o
dinheiro para a prostituta antecipadamente. Aquela noite conseguiu, enfim,
transar. Logo depois começou a namorar a moça.
Quando conversamos, Basílio dos Santos, que é negro e tem as
feições arredondadas e simétricas, a ponto de parecer um retrato falado, vestia
regata azul e bermuda verde fosforescente. O único indício de sua idade eram
escassos fios brancos que tentavam nascer na cabeça raspada, visíveis apenas de
perto.
Ele falava animado, pondo e tirando os óculos escuros de
aviador. Descreveu a transa com intensidade, alguma variedade semântica e muita
repetição – “Eu era putão. Putão, putão, putão, putão, putão” –, como se
quisesse atingir o grau zero da obscenidade. A ênfase que dava a suas
digressões sexuais tornava sua história pessoal opaca e cronologicamente
confusa. Basílio dos Santos passou um bom tempo falando da “prostituta enorme”
que foi sua namorada por seis meses.
Só muito mais tarde – após discorrer sobre a carreira de
metalúrgico e fresador ferramenteiro em São Paulo, sobre as orgias que
organizava com amigos no fim dos anos 70 e sobre as noites que passava
assistindo a pornochanchadas depois do expediente – ele esclareceu em que
momento foi “batizado” com o apelido pelo qual é conhecido. Em 1990, quando
atuava em seu primeiro filme pornográfico, no Rio de Janeiro, o produtor que o
havia contratado não estava satisfeito com o nome Clóvis, que considerava muito
banal. Ao ver a genitália do ator – a razão da resistência das prostitutas do
cais de Santos –, decretou: “A partir de agora você se chama Kid Bengala.”
Era uma manhã nublada de fevereiro, e o carro serpenteava a
estradinha bucólica em algum trecho impreciso nas cercanias de Carapicuíba, em
São Paulo. Árvores e mansões pontuavam o trajeto. “Quando eu crescer quero
morar numa casa dessas”, disse Cindy, e todos riram. No banco de trás, além
dela, acomodavam-se os atores Lolah e Loupan, e Carla Lira, a maquiadora –
todos contratados pela produtora Brasileirinhas, mencionados aqui por seus
nomes artísticos. O destino era uma casa num condomínio fechado da região, onde
seria gravado um filme com temática carnavalesca. No trajeto, Cindy contou que
naquela tarde faria sua primeira cena de sexo anal. Decidira encará-la com
Lolah e Loupan porque tinha confiança no casal. “Me sinto segura com eles,
temos amizade”, resumiu, sorridente.
Ao volante, o diretor Gil Bendazon, um paulistano da Mooca,
ruivo, de olhos claros e barba quase translúcida, explicava como certa vez
levou bolo de um fã. A Brasileirinhas havia feito uma promoção: sorteariam um
cliente para atuar numa filmagem. Avisaram o vencedor, que, animado ao
telefone, combinou hora e lugar para o encontro. Bendazon e outros funcionários
da produtora foram buscá-lo no metrô. O rapaz jamais apareceu.
Os fãs são chamados de “punheteiros”. Ao longo das semanas
em que nos encontramos, ouvi o termo muitas vezes: de Bendazon (nome
artístico), de Sérgio, o fotógrafo da equipe, de Clayton Nunes, o CEO da
Brasileirinhas. Longe de ser depreciativo, o apelido carrega certo afeto.
“Punheteiros” são os clientes fiéis, aqueles que sustentam a empresa.
Representam o oposto dos chamados “sazonais”, aqueles que assistem a filmes pornôs
para ver celebridades menores, reanimar o casamento ou satisfazer a
curiosidade. Enquanto subíamos a estradinha rumo à casa, Bendazon contava o
caso do fã sorteado com ar de desolação. A produtora quisera presentear um de
seus fiéis e não havia dado certo.
Quando chegamos à mansão, discreta e um pouco decadente,
havia um clima de confraternização na cozinha. Dênis Nunes, administrador do
espaço e irmão de Clayton Nunes, e Marcelo Ferreira, seu auxiliar,
cumprimentaram todos com abraços e beijos. Haviam preparado um café da manhã
farto: vários pacotes de pão de forma, duas térmicas de café, leite, suco,
fatias de presunto e queijo. Após a refeição, todos se dispersaram pelos
cômodos, preparando-se para a filmagem.
As casas que funcionam como locação de filmes pornográficos
não duram muito – dois ou três anos, se tanto. Segundo Bendazon, passado um
tempo, vizinhos reclamam, ou alguns curiosos dão um jeito de espiar, gerando
inibição entre os atores. Na casa atual, alugada três semanas antes da
filmagem, eles construíram uma extensão no muro para evitar que os moradores da
região pudessem bisbilhotar. O local passava por uma reforma extensa e
necessária: o gesso das paredes era frágil e decadente; a tinta estava gasta.
Três anos antes, a produtora alugara uma casa isolada na Praia Grande, no
litoral paulista. A mansão de Carapicuíba era o novo set.
O lugar não serve apenas como locação. A cada semana a
produtora envia uma atriz para morar na casa temporariamente. Os assinantes do
site da Brasileirinhas têm acesso a todos os cômodos através de sete canais,
supostamente 24 horas por dia. Depois de um mês, uma eleição entre os
assinantes determina qual atriz deve voltar ao ambiente. O programa é um
pastiche dos reality shows. A própria casa parece uma versão um pouco mais
sombria, mais caída, e também mais autêntica das que são vistas em programas
como o Big Brother Brasil. O apresentador da Casa das Brasileirinhas é Kid
Bengala – “O nosso Pedro Bilau”, conforme diz às gargalhadas Clayton Nunes, o
CEO, orgulhoso do trocadilho.
Como em outros programas do tipo, o real não é exatamente
real. Existe, por exemplo, um cronograma para as atrizes. Marcelo Ferreira, o
Black, é o encarregado de monitorar os horários. Existem tempos mínimos,
geralmente entre quarenta minutos e uma hora, para cada atividade obrigatória:
piscina, academia, banho. Em certo momento a atriz deve se livrar da roupa. Os
assinantes podem conversar com as moradoras temporárias pela internet em
horários predeterminados. Ferreira acompanha os chats, bloqueando mensagens
ofensivas e pedidos de contato pessoal. “Muitas atrizes trabalham também na
noite”, ele me disse, “e acusações de agenciamento de prostituição são
complicadas.”
Apesar do apelido, Black é um moreno claro, magro e de
cavanhaque ralinho. Além de controlar os cronogramas do reality pornô, ele
ajuda nas filmagens, nos ensaios fotográficos, na iluminação. “Pego gel,
camisinha, faço de tudo.” Também organiza refeições, supervisiona a reforma da
casa e cuida dos computadores. Frequentemente se ouve um grito, dos fundos ou
de dentro da casa: “Ô Black!” Foi um dos poucos a não se importar com a
publicação de seu nome verdadeiro na reportagem: “Tranquilo, bota aí.”
Nascido e criado em Santos, Ferreira montou móveis para as
Casas Bahia por dez anos, na condição de terceirizado. Após a fusão da empresa
com o Grupo Pão de Açúcar, deixou o emprego. “Ficou muito ruim para os
funcionários, o salário caiu demais.” Começou então a fazer bicos. Uma de suas
ocupações temporárias foi como porteiro de uma casa de swing, onde conheceu
pessoas do meio pornográfico. “Caí um pouco de paraquedas aqui, mas aprendo
muito rápido”, disse, enquanto fumava um cigarro no fundo da casa. No futuro,
pretende se matricular num curso de foto e filmagem, não necessariamente no
ramo pornográfico. “Quero fazer casamento, funeral, o que for”, comentou,
rindo.
Lolah e Cindy estavam sendo maquiadas num dos cômodos do
andar de cima. No chão do quarto jaziam colares, pulseiras e outras bijuterias.
As atrizes vestiam fantasias minúsculas de Carnaval que continham inúmeras
pedrinhas brilhantes, e pareciam mais bronzeadas do que horas antes. Cindy
experimentava as roupas sem embaraço. Lolah, mais quieta, não se mostrava
desconfortável com minhas perguntas, às quais respondia com uma reserva gentil.
Morena, de grandes olhos pretos, ela disse que só contracena com o seu
namorado, Loupan. Quando perguntei sua idade, respondeu: “Tô com 23, bem
velhinha já.” Ela ficaria na mansão aquela semana inteira, participando da Casa
das Brasileirinhas. Não parecia muito empolgada.
Mineira de Santos Dumont, Cindy contava que assistia a
filmes pornôs aos 12 ou 13 anos. “Eu adorava. Sempre soube que me envolveria
com esse tipo de coisa”, comentou, mostrando animação. Não soava falsa, ainda
que atrizes pornográficas sejam encorajadas a propagar mitos desse tipo. É
difícil, nesse meio, diferenciar o que é genuíno do que é inventado. Com o
tempo e as distorções da memória, é provável que meias verdades ou fantasias
ganhem aura de verdade plena.
Cindy enveredou para a área protagonizando filmes envolvendo
fetiches em produtoras menores. Logo se destacou e foi chamada para integrar a
equipe da Brasileirinhas. Um dos fetiches mais bizarros que encenou no começo
da carreira consistia em chutar os testículos do parceiro. Kid Bengala certa
vez a desafiou a reproduzir a cena com ele. Cindy gargalhava ao rememorar a
história (“Ele aguentou o tranco”), enquanto a maquiadora Carla Lira pedia num
tom de voz impaciente que ficasse parada. “Essa fala pelos cotovelos”, contou.
Carla, uma paraibana simpática de 41 anos, conserva um
resquício de sotaque, a despeito de morar em São Paulo há 25 anos. Ela começou
a prestar seus serviços para o meio pornô em 2004, ano que muitos consideram
como o marco inicial do crescimento da indústria. Por muito tempo se importavam
filmes do exterior, e pouco se produzia aqui. No fim dos anos 90, produtoras
nacionais começaram a crescer. A Brasileirinhas foi fundada em 1996, mas seu
auge, e o auge do pornô nacional, segundo todos os entrevistados, foi entre
2004 e 2009. A partir de 2010, afetado pela pirataria na internet e pelo
aumento da popularidade de sites de compartilhamento de vídeos pornôs – como
YouPorn, XVideos e Pornhub, que disponibilizam conteúdo de graça –, o mercado nacional
começou a enfrentar sérios problemas.
Testemunha dos reveses na indústria, Carla encara seu
trabalho com estoicismo. Apesar de a demanda ter caído, ela diz que cobra o
mesmo cachê – entre 200 e 300 reais a sessão – e ainda tem certa estabilidade financeira.
Não há sinal de nostalgia em sua fala quando relembra os tempos gloriosos do
pornô. “As produtoras são todas meio parecidas, tinha uma época em que eu saía
de uma e já ia para outra, e nem sabia o nome de onde eu estava, de tão igual
que era tudo.”
Os anos de carreira lhe proporcionam certo regard lointain,
uma vantagem de espectadora externa. Observou, por exemplo, que a decadência do
gênero tem gerado uma espécie de autofagia. Por questões de sobrevivência e
ego, o ator quer produzir, dirigir, atuar e assim por diante, num círculo que
nem sempre fecha redondo. Segundo ela, há hoje menos atenção a detalhes,
opera-se mais na base do improviso.
Carla sente saudade das putas. “Puta de verdade”, assim como
“punheteiro”, é elogio, e não xingamento – as inversões linguísticas são
recorrentes no meio. As “putas” são as atrizes profissionais, que chegam
prontas para o trabalho, não hesitam, fazem tudo que se exige de uma cena. “As
menininhas”, Carla disse, “ficam perguntando: ‘Mas será que eu tenho que fazer
isso, será que eu tenho que fazer aquilo?’ Elas dão palpite na maquiagem, ficam
com frescura para encarar o trabalho. Essas eu chamo de ‘putas de quatro
paredes’. É outra coisa, viu, não são profissionais. As putas de verdade para
mim são as divas. Mônica Mattos, Ju Pantera, Bruna Ferraz.”
Cindy, que ouvia, atalhou em tom sério, já maquiada: “As
profissionais se poupam, não vão para a balada na noite anterior.” Não havia
dúvida: ela se considerava um exemplo da categoria.
A sede da Brasileirinhas fica num edifício acinzentado, de
fachada sóbria, ao lado da Praça da República, no Centro em São Paulo. A
produtora ocupa apenas um dos andares. O escritório é simples, com duas salas
interligadas por um cômodo maior, onde funcionários silenciosos sentam-se lado
a lado. Os empregados estão conectados a sites pornográficos, mas agem como se
estivessem abrindo planilhas de Excel ou PowerPoint, morosos e distraídos, o
que gera no visitante um efeito desconcertante.
O CEO da firma, Clayton Nunes, iniciou sua trajetória
profissional na área de informática. Nascido e criado no bairro do Tatuapé, na
Zona Leste paulistana, se uniu aos 20 e poucos anos a alguns amigos para lançar
uma revista de tecnologia. “Começou assim, coisa de nerd mesmo”, disse ele em
sua sala. Simpático, dado a gestos efusivos, respondeu bem alto, quase
gritando, quando lhe perguntei em que se formara: “Fiz administração...
administração na São Luís!” – e gargalhou, como se caçoasse da discrepância
entre sua ocupação e o curso.
Empolgados com as possibilidades da tecnologia audiovisual,
e com a intenção de reportar inovações do meio na revista que almejavam criar,
Nunes e seus sócios alugavam fitas em VHS para passar o conteúdo para DVD. Os
filmes eram em grande parte pornôs. “No fim do expediente, funcionários vinham
pedir cópias emprestadas, sempre discretamente. Percebi que havia uma demanda
imensa por DVDs pornôs, talvez até por ser uma mídia mais maneira que o VHS,
aquele trambolho que ninguém quer ser visto carregando.”
Nunes teve uma outra ideia. Começou a contatar várias
produtoras de pornô, dizendo que lançaria uma “revista de sacanagem”: “Pedia
dez minutos de conteúdo, e em troca dava duas páginas de anúncio. Fizemos uma
compilação com as melhores cenas de vários filmes. Tinha de tudo: fetiche de
pé, dupla penetração, pornô mais tradicional. Na primeira edição, vendemos 60
mil cópias com o DVD encartado.”
Nunes queria vender mais compilações em bancas de jornal.
Começou a juntar capital e a comprar conteúdo. A Brasileirinhas era, então,
comandada por Luis Alvarenga, um empresário que sempre resistia às investidas
de Nunes. “A Brasileirinhas chegou a vender DVD por 60, 70 reais. Eu queria
massificar, vender mais barato, a 10, 15 reais na banca, pegar um público com
menor poder aquisitivo”, disse ele. Alvarenga, que Nunes define como um
pornógrafo da velha escola – “tinha cadeirinha de diretor, cinegrafista e tudo
mais” –, estava satisfeito com o modelo de negócios, focado em locadoras.
A expansão da rede de locadoras Blockbuster criou uma
pressão mercadológica que obrigou a produtora a repensar seu modelo de
distribuição. A rede americana – que viria a enfrentar suas próprias
dificuldades, em decorrência do crescimento do mercado de streaming digital –
entrara no país em 1995. Fundada no Texas, em 1985, a empresa sempre projetara
uma imagem associada a valores familiares, e por isso não trabalhava com vídeos
pornôs. Sua presença no Brasil forçou a quebra de várias locadoras locais, até
então importantes meios de distribuição para as produtoras pornográficas
nacionais. Em 2006, cinco anos após suas primeiras tentativas, Nunes conseguiu
licença para a distribuição de filmes das Brasileirinhas em bancas de jornal.
Em 2007, ele entrou como sócio da produtora e foi gradativamente assumindo o comando
total da empresa. Em 2010, Alvarenga se desligou da produtora.
O mercado estava aquecido em 2007. Os cachês eram altos,
lançavam-se DVDs, as produtoras investiam. Cerca de 100 filmes eram produzidos
ao ano, e a maior parte da receita provinha da venda de DVDs. Aumentava a
reputação da Brasileirinhas como uma das produtoras mais renomadas do mundo,
competindo numa área que era historicamente dominada por empresas americanas e
europeias.
Mesmo em posição economicamente favorável, Nunes já sentia
que o tempo das vacas gordas iria para o brejo. Lembrou-se de uma conversa que
tivera com o sócio, assim que entrara na produtora: “Não são só as locadoras
que vão sofrer. O DVD em banca de jornal também vai acabar, você vai ver”,
dissera ao outro.
Clayton Nunes cedo percebeu que precisaria cortar custos. A
pirataria na internet estava a todo vapor: mal era lançado, um filme já estava
disponível de graça. No Brasil, o acesso à internet mais rápida ainda estava se
consolidando, e foi só a partir de 2010 que o mercado pornô nacional começou a
sentir os efeitos mais nefastos da decadência que já ia avançada nos Estados
Unidos. O mercado pornô nacional mal se erguia e já começava a declinar.
Nunes passou a investir num site oficial da produtora,
convertendo todo o acervo para o formato digital. Com o tempo operou outras
mudanças. Além de estabelecer uma equipe regular para as filmagens, contratou
como diretor principal Gil Bendazon, que até então
só trabalhara com produtoras do exterior. O diretor tinha
carta branca para filmar regularmente, escalar atores e atrizes, editar os
filmes como bem entendesse.
Em 2007, o site da Brasileirinhas contava com cerca de 14
mil assinantes. Em 2012, a internet já representava 50% do faturamento da
empresa. O problema é que a migração não foi, nem tem sido, proporcional. O
faturamento da venda de filmes representa menos de um quarto do que era há
cinco anos. E, se em 2007 a produtora jorrava por volta de 100 filmes por ano,
no começo de 2013 esse número já havia caído para aproximadamente trinta
títulos. Hoje, lança-se uma média de um filme por mês.
Renata, a segunda namorada de Clóvis Basílio dos Santos,
também era prostituta. Ele continuou no ramo dos escapamentos por alguns meses,
até que decidiu pedir demissão e mudar de cidade. Em 1974, arrumou serviço como
torneiro mecânico em Sumaré, ao lado de Campinas, no interior paulista. Fazia
eixos de caminhão para uma multinacional americana. Juntou algum dinheiro nesse
emprego. Com o que sobrava do salário, viajava para São Paulo nos fins de
semana. Desembarcava na cidade logo depois do almoço e passava o dia em salas
de cinema, vendo pornochanchadas. Então perambulava por zonas de prostituição.
Às vezes tomava um ônibus para Santos. “Eu chegava dez, dez e meia da noite na
Baixada Santista, e ia direto para a zona do cais.”
A metalurgia, setor em que Basílio dos Santos trabalhava,
esteve no centro das mudanças políticas dos anos 70. Foi das greves do ABC
paulista, no final da década, que Luiz Inácio Lula da Silva despontou
nacionalmente. Quando perguntei a Kid Bengala sobre esse período, e mais
especificamente sobre a ditadura, ele não pareceu muito interessado, e até se
confundiu sobre quem estava no poder. Para ele, a década de 70 foi “a época das
pornochanchadas”. O ano de 1982 foi quando o “HIV começou a pegar mais”. E
1990, “o período pré-Viagra”.
Após trabalhar um tempo em Sumaré, Basílio dos Santos foi
promovido a fresador ferramenteiro. Seu salário dobrou e ele se mudou para São
Paulo. Na capital fez novas amizades, e em 1976 passou a organizar orgias. “Eu
convencia os amigos, fazia festinhas. Não era nada pago ou profissional.” Viveu
bem por alguns anos. Na passagem para a década de 80, contudo, em meio a uma crise
econômica que assolaria o país por vários anos, ele perdeu o emprego.
Foi um período difícil. “Entrei para a construção civil, fui
trabalhar de pedreiro”, lembrou. Havia uma ironia melancólica na situação. Seu
pai, com quem tivera sérios atritos na infância e na adolescência, também havia
sido pedreiro. No fim dos anos 80, com as finanças mais estáveis, ele voltou a
organizar festas. Conheceu “casais liberais” da elite que também se
interessavam por sexo grupal. Entre os novos amigos, havia um homem famoso de
tevê – “Não vou citar o nome dele, já está velhinho”. Tinha um fetiche
voyeurístico: gostava de ver negros transando com loiras. Arregimentava
mulheres dispostas a satisfazer essa vontade, e depois ligava para Basílio dos
Santos. Certa vez, um agenciador de prostitutas levou a própria mulher para
transar com Santos, enquanto o adepto famoso do fetichismo assistia à cena.
Assim como as prostitutas do cais santista, o agenciador se impressionou com
Bengala. Deixou-lhe um cartão.
Passou quase um ano até que Basílio dos Santos decidiu
contatar o agenciador, que lhe apresentou ao dono de uma revista. Foi ao Rio
fazer um ensaio fotográfico e lá conheceu um produtor de cinema, Carlo Mossy.
Brasileiro nascido em Tel-Aviv, que fizera fama na época das pornochanchadas,
foi Mossy quem lhe deu o apelido fálico que adotaria para sempre.
Em seu ensaio célebre, mas estranhamente moralista, “Big red
son”, o escritor americano David Foster Wallace caçoa da vulgaridade do
festival Adult Video News, AVN, em Las Vegas, que todo ano escolhe os melhores
da indústria pornográfica americana. Gil Bendazon se orgulha dos prêmios que
recebeu. Antes de ser contratado pela Brasileirinhas, trabalhou com produtoras
americanas, como Elegant Angel e Combat Zone, e se refere a esse mercado e seus
diretores como o padrão-ouro, o máximo do pornô. John Stagliano é seu François
Truffaut. “Ele visitou minha casa”, disse Bendazon na sede da produtora,
sussurrando, como se revelasse um segredo.
Stagliano é considerado um dos mais inovadores diretores da
história do pornô. Até o fim dos anos 80, os filmes em geral aspiravam a uma
estética hollywoodiana. Tinham enredos, atuações e trilha sonora na hora do
sexo. Inventor do pornô gonzo – nome que faz referência ao jornalismo gonzo, de
Hunter S. Thompson –, Stagliano procedeu a uma revolução na indústria.[1] Seus
filmes, lançados no início da década de 90, dispensavam enredo, trilha sonora
ou produção. Em seus primeiros vídeos, ele e Rocco Siffredi, um ator
pornográfico italiano que viria a se tornar famoso, flanavam pelas ruas.
Abordavam mulheres e as convidavam para a cama. Sem enredo, sem firulas. Quase
sempre eram atrizes contratadas, mas o objetivo era criar uma atmosfera
prosaica, de encontro acidental. Às vezes, Stagliano se inseria na cena –
filmava enquanto transava e fazia comentários para a câmera. O pornô gonzo se
espalhou. Filmes como os de Stagliano eram baratos de fazer, e a demanda por
esse tipo de pornografia, a julgar pelo sucesso de vendas, estava reprimida. A
indústria adotou o estilo.
Bendazon é entusiasta do gonzo. “O punheteiro”, disse de
modo enfático, “não quer saber de historinha, de narrativa.” Assim como Kid
Bengala, os clientes fiéis – os que alimentam as caixas de e-mail da
Brasileirinhas – estão mais interessados nas minúcias da transa em si. Bendazon
defende o enfoque no ato, mas não participa das cenas – como dirige vídeos
institucionais e comerciais de tevê, costuma cobrir a cabeça com um capuz nos
sets pornográficos para preservar sua identidade.
Uma das razões que determinaram a contratação de Bendazon
foi sua eficiência. Segundo Nunes, “o Gil não precisa de cinegrafista, de
iluminação, de auxiliar para isso, para aquilo. É ele e mais uma pessoa no set.
E só”. O apreço do empresário não se restringe ao aspecto econômico. Pelo
estilo minimalista, Bendazon tem o que Nunes chama, um pouco eufemisticamente,
de “ganho de privacidade nas cenas”. Os atores e atrizes se soltam mais, ficam
menos inibidos. A atmosfera do real – o éthos do pornô gonzo – fica mais
palpável. Há também certa admiração pessoal: “Quando descobri que tinha um
brasileiro ganhando AVNs, fiquei animado, quis trazê-lo”, Nunes disse.
Bruna Ferraz, uma das estrelas do meio, participou do
momento áureo do pornô nacional. Chegou a fechar um pacote de dezoito cenas com
a Brasileirinhas por quase 200 mil reais. “Ganhei uma bolada na época”, contou
quando nos encontramos na entrada de seu prédio, na rua Oscar Freire, em São
Paulo. Bruna, que adotou o sobrenome de uma atriz da Globo que admira, vestia
uma blusa de renda branca decotada e calça colada. A maquiagem, em tom
verde-escuro, estava particularmente concentrada ao redor dos olhos,
conferindo-lhe um quê das mulheres retratadas por Toulouse-Lautrec.
Nascida em Alegrete, uma cidadezinha gaúcha perto da
fronteira com a Argentina, Bruna foi adotada por uma mulher católica e criada
num ambiente conservador. Quando menina ia sempre à missa. Continua religiosa,
mas suas crenças atuais são um amálgama de candomblé, misticismo (“Todos temos
anjos da guarda”) e monoteísmo (“Ele é o mais importante, acima de tudo”). Às
vezes a atriz escuta vozes. “Sempre femininas”, disse. “Elas me dão instruções:
faça isso, não faça aquilo.”
Aos 18 anos Bruna saiu de Alegrete e se mudou para Porto
Alegre. Pouco depois foi para Foz do Iguaçu e começou a dançar em boates. Aos
24 anos, incentivada por uma amiga, foi para São Paulo, onde se destacou como
dançarina e logo começou a receber convites para eventos de revistas. Mas o que
suscitou o interesse da indústria pornográfica foi sua presença em vídeos da
internet – como já era bastante conhecida, pôde negociar um bom cachê.
Ela foi contratada numa época em que certas celebridades
começavam a se aventurar no ramo. Um deles foi o ator Alexandre Frota, que
deixou lembranças ambíguas de sua passagem pela Brasileirinhas. “Até a chegada
dele, o pornô era totalmente marginalizado, um estigma que vinha desde a época
da boca do lixo, das pornochanchadas”, comentou Nunes, e completou: “Frota
desmistificou isso.” No entanto, o ator e outros que, como ele – Rita Cadillac,
Gretchen, Mateus Carrieri –, rodaram filmes esporádicos só atraíram clientes
sazonais. Os fãs assíduos da produtora, os “punheteiros” que sustentam a
empresa, não gostam de celebridades. “Frequentemente mandam e-mails reclamando,
ou então comentam em fóruns – ‘Pô, e aquela cena risível de Alexandre Frota, o
pior ator pornô do mundo?’”, disse Nunes.
Bendazon também é cético em relação ao potencial dos famosos
no mundo pornô. “Não dão ângulo, dificultam a vida.” Ele não considera Frota e
outros como “atores pornôs de raiz”. Quando perguntei quem seria esse tipo de
ator, tanto ele quanto Nunes foram categóricos: Kid Bengala.
Bruna ainda atua, mas ultimamente tem se concentrado mais na
carreira de stripper e dançarina. Na última vez que filmou, contou ter fechado
um pacote de três cenas por “algo em torno de 10 mil reais”, muito menos do que
conseguia outrora. Ainda assim, seu cachê é maior que o de outras atrizes. A
maioria dos entrevistados estimou ganhar, por cena, entre 200 reais – de
produtoras menores, independentes, que burlam requisitos legais e nem pedem
identificação aos participantes – e 1 500 reais – de produtoras renomadas e
estabelecidas. Ninguém quis declarar exatamente quanto ganha.
Se, por um lado, a revolução gonzo libertou a pornografia do
pastiche, da imitação de segunda mão de Hollywood, ela também facilitou a
cultura do “Faça você mesmo”, lema do empreendedorismo. O pornô amador, filmado
por pessoas em suas casas ou lugares públicos, é hoje responsável por uma fatia
significativa do consumo.
Nunes não acredita que a produção amadora seja a pá de cal
das produtoras. “São nichos. O cara que vê filme amador em geral só gosta de
filme amador. Muitas vezes o que o atrai é o fato de que aquilo foi filmado sem
consentimento, por exemplo. Não é o que a gente faz. A Brasileirinhas é
conhecida pelos filmes bem-feitos, acho que nem se quiséssemos conseguiríamos
mudar essa imagem.” O problema maior, na avaliação de Nunes e Bendazon, são a
pirataria na internet e os sites que disponibilizam conteúdo ilegalmente, de
graça. É um problema insolúvel, impossível de monitorar. O mercado para DVDs
pornográficos está a ponto de se extinguir. “Hoje você lança um DVD para
mostrar que está vivo. Virou operação de marketing. Não dá lucro nenhum”, falou
Nunes.
No dia da filmagem, no carro, quando já voltávamos a São
Paulo, Bendazon contou que dentro de seis meses a Brasileirinhas provavelmente
não lançaria mais DVDs para venda; o acervo será apenas digital. Do banco de
trás, Loupan, que acabara de atuar aquela tarde, se assustou: “É sério?”
Paulistano do bairro de Santa Cecília, moreno, baixo e
forte, Loupan, de 31 anos, sempre começa as frases como se estivesse a ponto de
fazer uma revelação (“Posso te falar uma coisa?”, “A verdade é a seguinte”), e
conclui com uma piscadela de olho, satisfeito. Ainda menor de idade, ouviu de
uma de suas primeiras namoradas a sugestão de trabalhar como ator pornográfico.
Dois dias depois de completar 18 anos, fez um teste. Foi aprovado e nunca mais
parou de atuar. Orgulhoso da profissão, ele com frequência menciona os bens
conquistados com seu trabalho – carro, casa própria (“Comprei meu primeiro
apartamento aos 21 anos”) e, mais recentemente, um curso de inglês. (Naquela
tarde, um pouco antes das filmagens, Lolah o chamou para estudarem juntos.)
Loupan não esconde a raiva dos piratas: “Dá vontade de
entrar no computador e espancar esses caras”, disse-me, deitado numa cadeira ao
lado da piscina, com os olhos semicerrados e uma expressão serena que
contrastava com suas frases incisivas. “Não gosto muito de jornalista”, disse a
certa altura, calmo, sem traço de agressividade. Ele não vê na pirataria um
problema sistêmico. É uma questão de caráter: “Tem muito espertalhão no mundo.”
Apesar de criticar os que pirateiam, e tacitamente admitir o declínio da
indústria, Loupan não acredita que sofra ou venha a sofrer as consequências da
queda. “Quem é bom é bom, não tem concorrência.” É uma atitude comum no meio. O
declínio é aceito em termos abstratos, mas nunca de maneira individual,
concreta. A regra geral é válida, mas todos se consideram exceções.
Sérgio, o fotógrafo da equipe, paulistano filho de
japoneses, de 56 anos, é um que não se esquiva de admitir a decadência.
Preserva a identidade por razões financeiras. “Antes a gente sustentava a
família com o pornô, mas agora, que já não dá tanto dinheiro, não é legal se
expor.” Como atua em outras áreas – sobretudo fotos para jornais e anúncios de
joias –, prefere manter o anonimato. De estatura média, camisa polo, óculos de
grau e um ar tranquilo, só uma tatuagem na parte interna do antebraço destoa de
seu aspecto circunspecto. A tatuagem traz o sobrenome de sua família, grafado
em japonês.
Para Sérgio, o declínio da fotografia antecedeu o do pornô.
“O trabalho do fotógrafo profissional ficou muito difícil. Você mesmo poderia
ter tirado uma foto para essa matéria com seu telefone, não é?” Por já ter
experimentado uma turbulência, ele parece ter uma visão mais abrangente do
assunto. Evitando a atitude negacionista com que muitos tentam se defender de
um futuro sombrio, Sérgio enxerga a decadência da indústria dentro de um
contexto maior – é apenas mais uma das áreas que têm sofrido com o advento das
novas mídias. “Como o jornalismo, né?”, disse, com um sorriso cúmplice.
Em Experiência, seu livro de memórias, o escritor britânico
Martin Amis discorre sobre a dificuldade de escrever bem sobre sexo. O problema
consistiria no fato de cada ser humano ter preferências muito específicas nesse
âmbito, e daí ser complicado extrair de uma experiência concreta, individual, a
universalidade necessária à literatura: o oxigênio da empatia. Diante de um
sem-número de opções narrativas, recorremos a clichês.
A premissa de Amis é perceptível em filmes pornográficos.
Ainda que diferentes uns dos outros, todos eles têm um componente ritualístico
e previsível. As interlocuções são sempre as mesmas (“Vai, vai!”, “Que bom!”,
“Caralho!”), bem como a apresentação, regida por padrões e modas (genitália
depilada, maquiagem densa).
Bendazon me prometera acesso à cena que iria filmar,
frisando, porém, que eu não deveria permanecer dentro do cômodo, para não
constranger os participantes. O aparente paradoxo se resolveu. No dia da
filmagem, postado do lado de fora da casa, eu poderia espiar por entre uma
cortina de bambu que resguardava o set.
Não assisti mais do que uns poucos minutos, incomodado por
assumir aquele papel de voyeur. A filmagem ocorria no mesmo quarto que, horas
antes, quando chegamos para o café da manhã, parecia escuro e melancólico, com
colares carnavalescos espalhados pelo chão. Gil Bendazon, encapuzado, segurava
a câmera; Black se concentrava no laptop, sem capuz; Cindy movia-se sobre
Loupan, que estava deitado num sofá; Lola revezava seus esforços entre os dois.
A cena, genérica e similar a tantas outras, o reflexo do vidro e o isolamento
acústico me davam a impressão de estar vendo um filme através de uma tela.
Tarde da noite, terminada a filmagem, todos foram recolher
suas coisas para voltar a São Paulo. Na sala sobrou apenas Kid Bengala, que
havia interrompido a entrevista comigo para gravar a apresentação da Casa das
Brasileirinhas. Retomamos a conversa. Largado no sofá, sem camisa, as câmeras
desligadas mas ainda apontando em sua direção, Bengala voltou a falar de si.
Após rodar seu primeiro filme pornográfico, em 1990, no Rio
de Janeiro, o ator ficou apenas alguns meses na cidade. Fez mais dois filmes,
“para aprender a lidar com as câmeras”, e esperando ser chamado para atuar no
exterior. Ouvira que profissionais como ele ganhavam muito dinheiro na Europa e
nos Estados Unidos. (Anos depois descobriria que os atores de fora não eram tão
bem remunerados: “Essa história é balela. O que se ganha aqui ganha-se lá, a
diferença é pouca.”) De todo modo, como na época ainda não existia uma
indústria nacional de pornografia, Bengala retornou a São Paulo. Seguiu sua
vida como fresador ferramenteiro e retomou as orgias com amigos.
Um desses amigos, Sandro Lima, viria a se tornar
cinegrafista da Brasileirinhas. Quando o mercado cresceu, por volta de 2003,
2004, ele convidou Bengala a voltar à ativa. A princípio, o ator não acreditou
que a proposta pudesse cobrir seu salário na fábrica – lembrava que em 1990 o mercado
não pagava bem. Ofereceram muito mais. Já na casa dos 50 anos, ele assinou um
contrato de dois anos e logo passou a ser um dos atores mais importantes da
pornografia nacional, a ponto de ser disputado pela concorrência.
Contou que há poucos anos a Falotex, empresa que produz
extensores penianos, investiu na criação de uma réplica de seu pênis. A Adão e
Eva Toys, uma outra empresa, recentemente fez uma oferta para expandir em
escala nacional a distribuição do artefato. Bengala ganha royalties sobre cada
unidade vendida. Quando perguntei se o declínio da indústria poderia afetá-lo
de alguma forma, ele foi enfático, passando do uso da primeira para a terceira
pessoa: “A queda do pornô nunca alterou minha vida, em nada. Porque o Kid
Bengala é um ícone.”
Estimulado pela notoriedade alcançada, em 2008 o ator
decidiu candidatar-se a vereador pelo PPS (Partido Popular Socialista). Fez
campanha em prostíbulos, cabarés, boates. Abordou camelôs que vendiam seus DVDs
na rua 25 de Março. Conseguiu menos que mil votos. Afetado pela derrota, teve o
que define como uma “semidepressão”. Passou um tempo na Europa, filmando em
Hanover, na Alemanha, e em Salzburgo, na Áustria, mas não se adaptou. “Fiz uma
doideira”, disse, referindo-se à eleição. “Candidato de primeira viagem sempre
acha que vai ganhar.” No ano passado, no entanto, voltou a se candidatar, desta
vez a deputado estadual pelo PTB. Com pouco mais de mil votos, foi novamente
derrotado.
Ele desacelerou o ritmo da fala ao comentar os reveses. Mas
o desânimo durou pouco. Alguns instantes depois, Bengala já estava falante e
efusivo novamente. Enquanto discorria sobre a sua vida em São Paulo e a
ascensão ao estrelato pornô, interrompeu o raciocínio, como se tivesse
esquecido de dizer algo importante. Parecia o prelúdio de mais uma digressão
sexual, talvez uma lembrança do cais de Santos e das suas primeiras namoradas.
Mas, sorrindo, ele apenas arregalou os olhos e perguntou na minha direção: “Ô,
jornalista, você já viu o tamanho dele?”
por Alejandro Chacoff
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